Saiba como foi o 2º dia da conferência Rio Parada Funk 2017
Aconteceu no dia 1º de setembro, o segundo dia de conferência do Rio Parada Funk 2017, no MAR – Museu de Arte do Rio, evento produzido pelo coletivo Eu Amo Baile Funk. Caso você tenha perdido, confira esse texto sobre o 1º dia da conferência. No segundo dia de debate, tivemos novamente dois temas relacionados à cultura do baile funk. O primeiro, e talvez o que mais tem esquentado a cabeça da massa funkeira, era sobre “Criminalização do Funk”, e o segundo “Funk, Arte e Cultura além do ritmo”. O Portal KondZilla esteve presente para acompanhar esse importante debate carioca. Confira como foi:
No segundo dia, a conferência aconteceu no mesmo esquema do dia anterior. A sala principal recebeu os dois debates e um terceiro espaço falou sobre um aspecto da cultura carioca, dessa vez a dança. Aproveitamos o tempo livre para tirar uma foto da vista de cima do museu.
O evento estava marcado para começar às 16 horas, e o tema da criminalização deixou todo mundo de cabeça quente. O clima estava fechado na palestra, sem sorriso e muita apreensão. Na mesa, um time de pesos pesados do funk para falar sobre o assunto: MC Leonardo – cantor da Rocinha -, MC Smith – cantor do Complexo da Penha -, Orlando Zaccone, delegado de polícia e doutor em Ciência Política, Praga, compositor conhecido como “Caneta de Ouro“, DJ Sanny Pitbull, funkeiro com mais de 20 anos de carreira, e Mylene Mizrahi, pesquisadora do funk carioca premiada pelo Instituto Pereira Passos, órgão vinculado à Prefeitura do Rio de Janeiro.
Com o debate iniciando às 17h, MC Leonardo tomou o comando do microfone e falou sobre a audiência pública que aconteceu alguns dias antes. Leonardo é relíquia no funk e foi, ou melhor, é um dos principais articuladores do movimento, desde o começo da carreira, lá no início dos anos 90. Ele também é o criador do APAFUNK, entidade que auxilia MCs e o movimento de um modo geral. Sobre a audiência, Leonardo lembrou a importância da participação de todas as pessoas – seja MC, produtor, compositor, dançarino e principalmente o público. O movimento precisa de uma união de todos para ganhar força e resistir a mais uma investida. O MC ainda lembrou os problemas que funkeiros já enfrentaram e venceram, e esse seria mais uma luta contra. E para encerrar, surge da platéia a fala: “juntos somos mais fortes. E o funk tem que resistir e lutar”. Estava aberto o segundo dia de conferência do RPF 2017.
Quem continuou o discurso foi o MC Smith. O cantor, demonstrava muita revolta interna com a situação e bradou por quase 30 minutos tudo o que pensava e o que incomodava. Assim como Leonardo, o MC pediu a união de todos do movimento – que hoje está espalhado pelo Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia e outras regiões do país.
Citando as plataformas digitais de música, ele mostrou que funk e sertanejo são os rítmos mais consumidos no Brasil. O MC mostrou que “os MCs são repórteres musicais”, retratando o que vivem. “Quem vai salvar o Rio de Janeiro é o funk. Não se ganha guerra com guerra”, continuou. “O funk é uma opção do favelado para ser alguém. Plantando a cultura hoje, você vai colher o dançarino amanhã, o poeta, o cantor, o DJ…”. Entre outras falas, o MC passou o microfone dizendo que “faltam projetos sociais e culturais. A cultura, o lazer, a educação, capacitam as pessoas”, e com uma voz embargada e muito firme soltou: “A gente não pode desistir”.
Neste momento, já se passava pouco mais de uma hora do início do debate. GrandMaster Raphael pediu a colaboração da mesa para que todos pudessem falar sem se estender do horário programado, passando a vez para o delegado Orlando Zaccone. A fala dele foi uma das mais interessantes por ele ser do outro lado, diferente dos agentes culturais. Orlando comentou que esse problema contra o funk não vem de hoje, que há muitas pessoas lutando contra e que a briga ainda vai se prolongar. Entre algumas histórias contadas, o delegado comentou que “esse é um processo político de desmantelamento de organizações sociais”, o que soma com o dito pelos MCs: de que o movimento precisa se unir. “O problema não é o ritmo, e sim as pessoas e espaços públicos que trabalham no funk”.
Praga, compositor conhecido como “Caneta de Ouro”, foi o próximo a falar. Praga leu um monólogo que emocionou a todos presentes, lembrando porque é conhecido como Caneta de Ouro. Em seguida, a pesquisadora Mylene Mizrahi também leu um discurso que teve um olhar crítico sobre a dança, corpo e vestimenta do público funkeiro. Outra pesquisadora que entrou na mesa de surpresa foi Adriana Facina, que num breve discurso comentou do histórico de repressão que a cultura marginal recebe no Brasil. E destacou que “é importante entender as mensagens do funk”. O último convidado a falar foi o DJ Sanny Pitbull, que está no funk há mais de 20 anos e já rodou o mundo com sua MPC.
Sanny foi enfático ao dizer que “o funk é o espelho da sociedade”, reforçando os poucos lugares de fala que o movimento tem. Antes de encerrar a fala – porque o tempo já era curto – disse: “o funk não vai parar, o funk é a revolta”.
O sentimento que pude presenciar no debate era de uma dor sem fim. Estavam tirando a única alegria daquele povo. Ao fim do primeiro debate, abraços e sorrisos pareciam demonstrar a força de continuar lutando. Lutando em mais uma batalha, lado a lado.
E se o clima estava pesado na primeira mesa, a segunda foi bem mais amena e mostrou todo um lado artístico que o funk e que pessoas – de dentro e de fora – conseguem ter. A mesa era formada pelos palestrantes: Vag DoNasc (Artista Plástico e Curador da Exposição Memória do Funk), Carlos Palombini (Musicólogo e professor da UFMG), Maria Buzanovsky (Fotógrafa), Dani Dacorso (Fotógrafa) e Bruna Camargos (Educadora de Projetos da Escola do Olhar).
Cada pesquisador apresentou o seu trabalho e o olhar artístico que teve. Depois de um debate apreensivo e com um clima de tensão no ar, a arte deu espaço para apresentar o brilho da cultura carioca. Quem abriu a conversa foi Vag DoNasc, ilustrador e designer, que trabalhou em conjunto com o Rio Parada Funk e o coletivo Eu Amo Baile funk.
Em seguida, Bruna Camargo, do projeto Escola do Olhar, contou sobre o papel da educação na formação das crianças e também como a arte periférica tem espaço em espaços ditos como de intelectuais – digamos, um museu. Com uma história interessante de ouvir, a educadora apresentou por fotos a primeira vez em que o funk chegou ao MAR. Era uma excursão de duas escolas públicas distintas que em determinado momento de descanso rolou um duelo de danças. Bruna explicou qual a importância da dança e da música ao conquistar espaços como o do museu, e como isso deve ser feito com mais frequência.
Carlos Palombini foi o próximo a falar. Pesquisador de funk com o trabalho “O errado que deu certo“, ele, de forma inusitada, apresentou um “causo” sobre a música “Deu Onda” do MC G15. Esse trabalho já esta disponível na internet e mostra como diversos vozes orbitaram em torno do sucesso, seja comentando que a melodia estava fora de tom, seja explicando de forma detalhada como o produtor e cantor acertaram num tom politonalismo. Eu mesmo me diverti com a história que você pode conferir aqui.
Voltando a parte imagética Maria Buzanovsky e Dani Cardoso, apresentaram e explicaram como surgiu a proposta dos ensaios fotográficos.
Confira como foi a conferência pelas fotos abaixo: