O ‘Jacarézinho-Camaleão’ é a evolução dos cortes de quebrada
“A mão vive cheia de calo agora, todo mundo quer fazer, pô”, abre a conversa o barbeiro Zóio Mão de Ouro. Criador do ‘Jacaré-Camaleão’, aquele arrepiado que muda de cor, o corte viralizou pelas redes rapidamente, aumentando sua clientela e levando seu trabalho até pro exterior. “Recebi proposta pra ir pra Itália, com estúdio e tudo pago”. Essa não seria a primeira vez que cortes da periferia rodam o mundo, e o Portal KondZilla te conta mais sobre essa fita.
“Gravei o vídeo, mas na hora que ia postar chegou um cliente pra cortar, no meio do corte, eu postei o vídeo e deixei lá como quem não quer nada, né?. Quando cheguei em casa um amigo me perguntou o quanto eu impulsionei, porque já tinha 200 compartilhamentos! Quando fui ver já tinha 300 e não parava de subir”, conta Josuel sobre como surgiu a ideia de postar o vídeo em seu Facebook e no Instagram. O vídeo viralizou de uma forma que o barbeiro não imaginava, sendo postado por páginas de memes e até uma galera da gringa perguntando como era aquilo era possível. “Tinha uns comentários em outro idioma, não entendi nada, perguntando se era mágica, que tinta eu usei, como fazia a tinta”.
Se você é uma dessas pessoas que vive ligada no que está rolando na internet, provavelmente você viu o vídeo onde um jovem que com uma simples virada para o lado mudava a cor do cabelo. Muitos falaram que era mágica, que era alguma tinta especial ou efeito de algum programa de edição, mas não é nada disso não. Com apenas uma lata de tinta azul e uma vermelha, surgiu o corte ‘Jacarezinho-Camaleão’. Vou te explicar melhor.
O nome do corte de cabelo original é ‘Jacarezinho’, onde os cabelos ficam extremamente arrepiados e separados, sendo possível ver a raiz e um pouco do couro cabeludo da pessoa. A ideia do camaleão não veio pelo corte ‘Jacarezinho’, mas sim pela mudança de cor no cabelo, então colocar diversos tons de cores no cabelo já é um estilo de camaleão. “A variedade de tinta que dá o nome de camaleão, a pessoa pode colocar em qualquer corte, o que mais famoso aqui [Osasco] foi no blindado” conta Josuel Santos, 25, o cara que postou o vídeo que viralizou na internet.
“Esse corte é um dos mais difíceis porque no momento que você tiver arrepiando não pode cair nenhum outro resíduo se não abaixa e tem que voltar tudo do começo”. Acompanhei desde o início como é feito o corte ‘Jacarezinho-Camaleão’. O primeiro passo é fazer o famoso degradê nas laterais, que em algumas quebradas é conhecido como disfarce, que basicamente é ir diminuindo o comprimento dos fios até chegar a parte do pezinho, como se fosse perdendo o volume mesmo.
O segundo passo é lavar o cabelo para fazer o principal processo de todo o corte, arrepiar e separar os fios, após lavar Josuel seca o cabelo com um secador. Em seguida vem a chapinha para que os fios tenham mais firmeza, com um pente o barbeiro vai levantando o cabelo e separando os fios com a mão. Com todos os fios levantados, vem uma bela camada de laquê para firmar o cabelo em pé e deixá-lo arrepiado, com todo processo feito. Agora vem a parte que chocou todo mundo, o barbeiro escolhe duas cores, a primeira é passada de frente para trás e a segunda passada de trás para frente, sem deixar que as cores se misturem, logo assim o efeito camaleão ganha vida.
Segundo Josuel, algumas coisas mudaram em sua vida após a viralização do vídeo. Ele conta que além da clientela aumentar, ele também recebeu convite para fora do país após a repercussão do vídeo, “Recebi proposta pra ir pra Itália, com estúdio e tudo pago, mas é foda, a gente para pra pensar que tudo veio rápido, em duas semanas só né, nóis é sofredor não imagina que tudo vai virar tão rápido [sic]”.
Josuel e Valter Silva, 28, são sócios da barbearia Mão de Ouro. Os dois se conheceram trabalhando juntos em uma barbearia da quebrada onde moram em Osasco. “Quando saí da barbearia onde a gente trabalhava, tava com medo, não tinha outro trabalho fixo, tenho filho pra criar, fica complicado pra se manter e arriscar abrir um negócio” conta Josuel sobre a iniciativa de abrir a barbearia junto com o amigo. Muitos clientes da barbearia onde Josuel trabalhava optaram por continuar cortando com ele em seu novo estabelecimento. “Aqui é uma quebrada onde tem muito barbeiro, e muito barbeiro bom, mas chegamos com novidade, fazíamos um arrepiado, então o pessoal começou a procurar a gente”.
A dupla conta que no início que começaram cortar e pintar cabelo sofreram preconceito da galera do bairro. “Quando começamos a pintar cabelo um ano atrás, o pessoal falou que era coisa de menina, coisa de homossexual”. Apesar dos comentários os dois seguiram e hoje são destaque no bairro que é formado por muitos barbeiros, inclusive todos são amigos, foram professores no início da carreira de alguns e hoje frequentam o salão um do outro.
“Comecei com 11 anos, na época era somente tesoura, pente e a gilete com sabão, quando vim pra São Paulo nunca me imaginei que iria trabalhar somente com isso, tanto que comecei em outro trabalho, um lava-rápido, depois polimento de carro”, explica Josuel Santos, 25, o Baiano de Ponto Novo, um pequeno município da Bahia, que veio para São Paulo com 14 anos atrás de uma vida melhor como muitos fazem. No início o jovem conseguiu alguns trabalhos fora do que estava acostumado a praticar, mas em um momento de desemprego, surgiu a oportunidade de trabalhar com um conhecido, Joel. Foi esse cara que deu oportunidade para Josuel. “A máquina que eu tenho até hoje é que o Joel me deu, ele foi me passando umas técnicas também”.
A ideia do ‘Jacarezinho-Camaleão’ é uma evolução de todos os cortes das quebradas do Brasil, arrepia ali, passa escova aqui, pinta ali e assim vai surgindo cortes que viram tendências e que viralizam na web como se fosse coisa de mágica, mas é simplesmente a galera periférica criando e recriando seu próprio estilo sem padrão nenhum.
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