Comportamento

“O Grafite mudou a minha vida”; olhares sobre o Dia do Grafite

27.03.2022 | Por: Carolina Matias
Arte grafite em prédio

Hoje é dia de celebração! 27 de Março é o Dia Nacional do Grafite. É uma data que semeia cidades com muita arte e resistência.

O grafite é uma expressão cultural. Ele colore as ruas de todo o mundo e muda a vida de muitas pessoas.

O movimento ganha cada vez mais visibilidade nos muros e prédios. E em qualquer lugar que for legal de pintar.

O grafite muda vidas. Essa é uma frase que representa muitos grafiteiros.

Quer saber um pouco mais sobre a história desse dia? Marcha que o conteúdo tá incrível! Aqui no Portal da KondZilla nós separamos alguns profissionais que fazem a diferença no cenário do grafite!

Grafite na História

Presente em grandes cidades, o rolê do grafite se iniciou ligado à cultura Hip Hop.

O movimento trouxe questionamentos sobre violação e foi contra uma cultura que incomodava grupos e cidades.

Alguns jovens começaram a deixar suas marcas nas paredes da cidade.

Um tempo depois, o estilo evoluiu com técnicas e desenhos, revolucionando a arte e as manifestações periféricas.

No começo, o grafite se caracterizou com os artistas atuando de forma autônoma. E mesmo assim, o grafiteiro usava a cidade como suporte de comunicação artística sem delimitação de espaço, mensagem ou assinatura.

ENIVO

O olhar periférico e apocalíptico Enivo

Trabalhar com grafite é mostrar toda a potência da arte urbana. E para falar desse assunto, conversamos com o artista Enivo, 35, nascido e criado no Grajaú, São Paulo.

Créditos: Reprodução // A7MA.

Ele explicou seu ponto de vista sobre como é trabalhar com arte urbana:

“Trabalhar com arte urbana foi uma benção recebida, porque é um trabalho duplo:

Mostar que o trabalho é um risco, é você muitas vezes estar nesse lugar, fazer algo que é ilegal”, disse.

Enivo fala em como os artistas urbanos, de rua, enfrentam a justiça através de suas ideias:

“Seja através de um protesto, seja uma identificação estética, um mural, um trabalho bonito, multivacional, seja uma pixação”, disse.

“A gente já corre um risco na cidade pra não ganhar nada, então, primeiramente, é um trabalho voluntário”.

O grafite mudou a vida de muitas pessoas

Para ele, o reconhecimento só vem depois de muitos anos de trabalho voluntário e de dedicação.

A partir disso, o artista passa a ser convidado para participar de eventos. Além de dar aula e ter o seu trabalho realmente valorizado. 

“É um processo inverso né, primeiro você se doa, pra depois você receber. Esse é o trabalho de um artista de rua:

se doar por anos pra depois, num momento mais maduro, colher frutos”, disse.

Contudo, mesmo depois de conquistar um lugar de reconhecimento, os artistas urbanos ainda são denunciados, sofrem humilhação e abordagens violentas. É um trabalho árduo, segundo Enivo.  

Em contraponto a isto, colocando as situações em parâmetro, o grafiteiro conta que:

“É um trabalho muito bonito, porque a sociedade em si está se conscientizando”, disse. “Está sendo acolhida também pela arte de rua”.

“(As pessoas) Estão enxergando o que a cidade quer dizer. É um processo muito lento mas que está mudando, mudando pra melhor. É mais bonito se trabalhar com arte urbana”, conclui.

Obras do artista Enivo

As obras de Enivo buscam dialogar com a sociedade, mostrar a força da arte negra e da arte periférica. Ele conta sobre o poder da arte de circular por toda a cidade, inclusive pelos lugares nobres. 

A periferia está ocupando bairros e lugares diversos, e vai conquistar o mundo:

“(Estar) por outros países, por outros continentes, mostrar a nossa cena mesmo. Periférica, o afrofuturismo, as tendências, as possibilidades de novas tribos, chamadas tribos do futuro”.

“Mostrar possibilidades, mostrar que o negro pode, mostrar que o negro está em evidência e é evidência”, coloca o artista.

Somos mais, somos juntos, somos unidos

“E é isso, essa é a minha força, conversar, dialogar, trazer entendimento, questionamentos”

“É pensar sobre o tempo, sobre o mundo, sobre o apocalipse, sobre o novo mundo, sobre as novas civilizações. É isso que eu busco passar quando eu pinto algo”, disse.

Grafite é Sinônimo de Liberdade

O grafite é uma forma do artista ser livre. Ter atitude para fazer algo que ninguém pediu:

“É você estar sozinho ou com amigos e sair por aí pra buscar um espaço na cidade. Pra compor a cidade, pra fazer da cidade uma agenda, um carimbo”, conta Enivo.

Grafite “É pintar livremente. Seja uma ideia, um pensamento estético, um carimbo, ou o seu nome, o de alguém que você gosta”, disse.

“Seja uma palavra, tá livre, sem ninguém te brifar nem te dar nada, é você ter atitude”.

“Grafite é você ter atitude e fazer algo que ninguém te pediu. É dar o seu melhor nisso”, disse o grafiteiro.

Grafite na Construção de um Novo Mundo

O grafite tem o poder de influenciar muitas pessoas e atinge principalmente pessoas sensíveis, como disse o artista.

Algumas pessoas possuem dificuldade para se identificar em determinada função outras de se encaixar em alguns grupos. Para Enivo, o grafite foi o lugar onde a identificação aconteceu. 

Créditos: Reprodução // Paraisópolis, 2020.

O grafite influenciou na minha mudança, na minha evolução como ser humano, na comunicação. Também no meu pensamento geográfico, no meu pensamento sobre o mundo”.

“(O grafite) me fez ter visão de mundo, me fez entender a sociedade, as diferenças sociais. E perceber que o artista caminha no meio, e entende e observa os extremos”, disse.

A arte do Grafite

A arte do grafite está presente e é a construção das novas cidades, de um mundo novo. A prática dialoga diretamente com a vida e em como as pessoas se colocam na sociedade.

Créditos: Reprodução // Grajaú.

“O grafite mostra outras possibilidades de se viver bem. É sinônimo de vida, liberdade e união, é isso que eu penso, transformação”, disse.

Enivo conclui: “O grafite é a transformação, a transmutação de um ser que procura existir. É para alguém que de fato atua, faz, existe e deixou um legado. Essa é a importância do grafite, é isso que ele influencia pras pessoas”.

Enivo é um dos artistas da galeria de arte A7MA. O espaço busca “amplificar a arte contemporânea com influências da rua, até o limite do possível”.

Créditos: Reprodução // A7MA.

YAYA

A arte urbana passa conhecimento para favelas, periferias e escolas, por exemplo. E falando sobre este assunto, a artista Yaya, 24, de São Vicente de Carvalho, Rio de Janeiro, passou a visão. 

Para ela, “Trabalhar com arte urbana é carregar nas mãos uma possibilidade. É melhorar o dia de alguém através da cor. Da mensagem também, de fazer com que as ruas sejam lugares mais acolhedores e seguros”, disse.

Créditos: Yaya Ferreia.

Um espaço criado por elas

As mulheres no grafite vêm protagonizando e representando suas histórias através da arte. Isso ocorreu também com Yaya.

Seus caminhos neste mundo foram abertos por mulheres. Assim, o grafite cresce em busca de criar um espaço diverso e acolhedor.

O grafite é um lugar muitas vezes intimidador e que não inclui corpas diversas. Yaya conta sobre sua experiência:

“Eu só tive coragem de chegar num muro depois que tive contato com outras minas que pintavam. Tive a oportunidade de aprender com essas mulheres em espaços criados por nós e para nós”, disse.

Créditos: Artur Viana.

Artistas representando mulheres

A vida de mulheres pretas, periféricas, LGBTQIA+, mães e tantas que têm suas histórias silenciadas, encontram no grafite tal representação.

“Quando a gente se representa, a gente cria espelhos e cria um ciclo de pessoas (mulheres, pessoas LGBTQIA+, pretes). A galera se sente bem nesses espaços e gera ainda mais arte nas ruas”, conta Yaya.

Um lugar de resistência

Para Yaya, o grafite é resistência e uma forma de demonstrar afeto. A falta de acesso assola uma parte da população, principalmente quando o assunto é arte no geral.

Essa aproximação cria, para a artista, “Uma evasão da rotina, (cria) um ponto de cor na cidade. Cria uma possível inspiração pra alguém”.

Créditos: Yaya Ferreira.

Uma puxa a outra

Sendo um espaço que atiça a coragem e o enfrentamento, o grafite é uma rede. É um caminho em que mulheres podem se ajudar. 

“Eu só comecei a pintar porque vi outras minas no rolê. Faço questão de levar mais minas comigo sempre que possível”, disse Yaya.

A artista conta que o grafite é, de certa forma, uma mensagem. O grafite feminino segue uma linha de superação e até de espiritualidade.

“Sentimos que não estamos sozinhas, o mundo é nosso!”.

>foto Abram os Caminhos”<

O visual moderno e vibrante de GRIÔ

Trazendo figuras de diversos elementos, o grafite é uma ferramenta de mudança. Para o artista Griô, 23, da Brasilândia, o movimento urbano, assim como o Hip Hop, salva vidas.

Sobre os trabalhos na rua, Griô fala:

“Trabalhar na rua é chave de inserção no mundo de quem foi privado de várias oportunidades”, conta.

Créditos: @vxldinei

Para o artista, a oportunidade que o grafite pode oferecer significa, também, utilizar do espaço que foi dado. E, com isso, ressignificar o beco abandonado da quebrada para uma mostra de arte a céu aberto.

É importante esse olhar para que o artista se sinta à vontade. Que possa frequentar esses espaços de uma forma segura. De estar nas ruas e colocar suas identidades e vivências.

Referências da Cultura Negra

Griô é um artista que traz em seus trabalhos elementos do cotidiano.

Suas obras decodificam a violência e a transformam em arte. Nisso, ele acaba influenciando muitas pessoas: 

“Ver alguém como eu, com um trabalho relevante na rua, faz com que outros se reconheçam. E, assim, se sintam capazes de criar, viver de arte”, disse.

Com referências da cultura negra, seu trabalho surge como um informe. Ele viaja entre as referências clássicas, como o Hip Hop, e filmes blaxploitation.

Griô conta um pouco sobre seu estilo:

“Com um visual moderno e cores vibrantes, mostro histórias do bairro pra quem passa pelas ruas”, conta.

A influência do grafite para outras pessoas

Os caminhos dentro do movimento do grafite e da arte urbana são muito dolorosos, segundo Griô. Isso afeta principalmente jovens, pretos e periféricos. A realidade é violenta.

Créditos: Reprodução // Griô

O artista traz um pensamento que mostra um outro olhar sobre o assunto:

“A importância disso, pra além de se expressar, o que torna a vida mais leve e poética”, disse.

E completa: “É poder mostrar que existem caminhos menos dolorosos para os meus. É potencializar as aptidões e vontades de cada favelado”.

O ponto chave na fala de Griô é mostrar que: ““você pode ser quem você quiser”. É isso que eu quero que as pessoas sintam ao verem uma pintura minha”, disse.

O corre independente de FANY

A artista Stefany Lima, ou FANY, 26, é de Embu das Artes, São Paulo, e atualmente mora em Camaragibe, PE.

Ela é uma artista que retrata figuras negras. As mulheres estão em quase todas as suas obras. A relação dela com a arte urbana veio do grafite.

Hoje, o grafite e a cultura Hip Hop são os eixos de atuação de FANY. Ela também trabalha com educação, projetos culturais e está concluindo a graduação em Artes Visuais.

Créditos: Reprodução // Instagram FANY

Fany começou a pintar na rua em 2013, e logo se identificou. Para ela, o movimento do grafite:

“Foi o que fez brilhar os olhos, instigou a estudar e aprimorar o que faço. Foi o que ampliou meus horizontes e deu base pra buscar outras paradas”, disse. 

Desafios na prática

Um dos seus principais desafios é lidar com o inesperado e com o improviso. Na rua, são os processos e a cara da artista que estão expostos.

Ela conta que aprende muito na prática e na troca: “É preciso saber chegar e sair. É um corre independente, mas também gratificante pelas oportunidades de conhecer vários lugares”, disse.

Representação feminina em suas obras

As mulheres negras representam a maioria das figuras que Fany pinta. “De início foi por uma questão de identificação e afirmação. Foi uma forma de entender mais do que seria essa representação”, disse.

A rua é um lugar de identificação, de buscar referências e se conectar. 

Rua é substantivo feminino, né? Outras minas também se identificam”, conta Fany.

Independência do grafite

O grafite é um movimento que vai além de técnicas definidas.

E de materiais específicos, segundo Fany. Significa vivência, pertencimento e coletividade.

Fany conta que: “Há registros muito antigos de expressões nas paredes. Na minha visão, continuam sendo agregadas várias referências”.

“Mas o que conceituou muito do que conhecemos por graffiti hoje, foi o movimento Hip Hop”, disse.

Créditos: Reprodução // FANY

O importante é a troca, “Independente do estilo, passa por buscar e compartilhar conhecimento. Criar relações com as pessoas e interações com a rua. Estar num espaço muitas vezes cheio de tensões, mas também de possibilidades”, conta Fany.

Influenciando outras minas

Fany, assim como muitas outras grafiteiras, acredita que criar em grandes dimensões na rua a fez mais corajosa. 

É sobre superar as próprias limitações: “A autonomia é uma influência chave”, conclui a artista.

Curtiu a história e a visão dos artistas que a gente selecionou?

Cada um tem um ponto de vista, porém, as histórias se ligam em diversos pontos. O dia do grafite é uma data de resistência. E é uma data que pode dar mais visibilidade para os artistas.

Portanto, compartilhe o trabalho de seus amigos, de artistas independentes, pretes e de quebrada.

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