Dança

As danças que marcaram o movimento funk

18.07.2017 | Por: Guilherme Lucio da Rocha

A música e a dança sempre estiverem muito próximas, e isso não seria diferente com o baile funk. Isso acontece desde os primórdios, com os bailes no asfalto e os passinhos coreografados (flash mobs, alguns podem dizer) do Rio de Janeiro, até os tempos atuais, com as sarradas e o passinho dos malocas, que dominam as periferias de São Paulo. Para entender mais sobre essa parte da cultura, o Portal KondZilla conta um pouco mais dessa ligação e traça um paralelo entre os movimentos.

Podemos dizer que as leituras sobre a dança no funk começaram lá na da década de 80, quando a música americana chegava no Rio de Janeiro ainda como funk do James Brown. O tempo foi passando, e no final da década de 80 começaram a chegar no Rio de Janeiro discos com um ritmo diferente, influenciados pelo hip-hop americano e também pelo ritmo da Flórida, o Miami Bass.

A música de Miami era produzida na bateria Rolland 808 – como falamos nessa matéria – e os bailes cariocas da época reuniam bastante gente para dançar o novo som. O que não rolou foi atualizar o nome de ‘funk’ para hip-hop, mas essa história fica pra outro dia. Voltando à dança, os passos do novo som eram muito simples em comparação com o que vemos hoje. À época, inclusive, existiam muitos passos coreografados em grupo, onde a galera toda do baile dançava em passos sincronizados.

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Baile do Charme

“Era algo totalmente espontâneo, e todo o baile seguia a coreografia. Lembro de uma música em específico – ‘Heartbeat’, do grupo ‘War’ -, que a galera chama de ‘Melô do vai e vem’ e fazia uma coreografia de vai e vem mesmo, era algo em massa”, explica o DJ GrandMaster Raphael, um dos especialistas no assunto “funk carioca”.

O tempo foi passando e o funk foi ganhando proporções enormes no Rio de Janeiro. Já nos anos 90, por conta de incidentes violentos e registros de brigas nos bailes funks que aconteciam em casas noturnas localizadas no centro do Rio (conhecido como “asfalto”), o movimento acabou reprimido pelas autoridades cariocas da época e retornou a comunidade.

Como disse GrandMaster Raphael, “o funk subiu o morro”. E nessa época, ainda de acordo com GrandMaster, o funk carioca dava vida ao ‘tamborzão’, a primeira batida nacionalmente produzida pelos cariocas e um dos maiores símbolos da vertente. A nova batida ajudou a dar mais ritmo pro movimento, o que também melhorou a dança. Com a popularização da batida, o funk chegou a ocupar lugares como programas de TV e começaram a surgir os primeiros grandes nomes da vertente, junto das primeiras danças exclusivas do funk. Ou melhor, os passinhos.

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Dynho Alves –  Passinho dos Maloqueiros

Nesse trânsito da música, começaram a surgir também os primeiros bondes que eram especializados em dança, como o grupo “Bonde dos Carrascos” e o “Bonde do Vinho”. Entre os principais grupos, o “Bonde do Tigrão” ficou nacionalmente conhecido com as músicas “Cerol na Mão” e “O Baile Todo”.

Esse bondes abriram caminho para o grupo “Os Hawaianos”, que se tornaria o principal grupo de dança no funk e referência para diversos MCs – como o MC 2K, por exemplo, que confessou ao Portal KondZilla que tinha o sonho de ser dançarino, graças ao grupo carioca. Mesclando passinhos complexos e danças que arrastavam multidões, “Os Hawaianos” marcaram presença não só no Rio de Janeiro, como no movimento de um modo geral.

DVD – Os Hawaianos

“Nós brincávamos de dançar nos bailes da Cidade de Deus e, certo dia, decidimos levar a coisa mais a sério. Lá em meados de 2004, fizemos as músicas “Vem Quicando” e “Dança do Bonequinho”, que viraram febre na comunidade. Depois disso, fomos convidados para um programa da Globo e fizemos turnê pela Europa. São coisas que dão orgulho”, conta Yuri, um dos fundadores do grupo e único remanescente.

A febre do passinho dominava o Brasil, ganhando no Rio de Janeiro o apelido de “passinho foda”. Montagens dançantes, muitas vezes sem letra, apenas com aquele ponto embrazado que faziam que desde crianças (até o tiozão) dançassem livremente, sem precisar seguir uma regra ou coreografia – diferente do que acontecia nos bailes dos anos 80. Agora era só mexer o corpo da forma que você quisesse. O sucesso do passinho era tão grande, que foram criadas competições de passinho por todo o Rio de Janeiro.

Batalha do Passinho

No final dos anos 2000, o funk começava a chegar com força na capital São Paulo, ganhando características próprias. Antes importado do próprio Rio de Janeiro e da Baixada Santista, o funk paulistano assimilou o movimento e criou uma cara própria, a cara da ostentação.

Ficou difícil dançar com letras falando de carros, dinheiro, mulher e uma batida mais retraída. Porém, São Paulo precisava de uma identidade na dança e, graças ao intercâmbio com o Rio de Janeiro, essa identidade veio com o passinho do romano, lá em meados de 2012. Um dos destaques desse movimento é o Fezinho Patatty (já falamos dele aqui).

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Fezinho Patatty

“No que toca às conexões entre passinho do romano e passinho foda, penso que elas podem ser vistas não somente nos movimentos corporais, mas sobretudo em um estilo englobante, que cativa os jovens que o criaram. Em ambas as danças vemos o elemento de deboche, de ironia e mais ainda de jocosidade, de querer provocar o riso”. Essa fala é da sociólogo e antropóloga da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mylene Mizrahi, que já produziu trabalhos premiados sobre funk e suas relações com a dança.

E como a evolução da dança no mundo do funk é quase diária, já temos o novo passinho do momento: o paulistano ‘Passinho dos Malocas’. Mais fácil do que seu “primo” – o Passinho do Romano – , a nova dança do momento é focada no deslocamento dos ombros e exige pouco molejo, o que ajuda a galera mais durona.


Godoy Explode Funk

“O que ocorre é que a dança funk, assim como o próprio funk, resulta de apropriações sucessivas, de leituras e releituras como se cada inovação fizesse um comentário sobre aquilo sobre o que se inova. Ou seja, essas inovações produzem o novo, sem contudo produzir uma ruptura com o passado”, completa Mizrahi.

Muita gente já sabe que o funk é uma verdadeira ‘roda gigante’, e as mudanças são quase diárias. E a dança, como um dos elementos do ritmo, não seria diferente. Agora fica a dúvida: qual será a próxima dança do momento?

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