Entrevista

“Tô curtindo demais essa fase”, MC Cabelinho surfa no rap e no funk

10.04.2018 | Por: Andre Izidro

*Todas as fotos por: Carolina Demper // Portal KondZilla

O funk e o rap têm muita coisa em comum. Nascidos na periferia, eles conversam entre si desde os seus primórdios. Só que no Brasil, essa relação daria pano pra novela das 9. Lá no final dos anos 90, acontecia uma relação beeeeem distante, que começou a mudar e se aproximar um pouco no início dos anos 2000, culminando num belo inicio de namoro nos tempos atuais com álbuns como 18k – mesclando rap e funk. Um dos artistas que pisa nesses dois terrenos é o carioca MC Cabelinho, nome de destaque no funk do Rio de Janeiro e que vem fazendo trampos bem relevantes no rap também. O Portal KondZilla trocou uma ideia com o artista e fala um pouco mais desse relacionamento dele com os dois ritmos:

“Tô curtindo pra caralho essa fase”, adianta o cantor carioca em entrevista exclusiva ao Portal KondZilla. Aproveitando a boa fase dos movimentos, que no passado tiveram um rixa e hoje dialogam com álbuns e colaborações. Essa é uma história conhecida na periferia: nos anos 90, rap era consciente e funk era dança. Já nos anos 2000, o funk explodiu do Rio ao litoral paulista com uma mistura do ritmo do funk, com a mensagem do rap – o DJ Baphafinha e o MC Neguinho do Kaxeta já deram o papo sobre esse momento.

Atualmente, o relacionamento dos movimentos está forte e Cabelinho aproveita pra viver intensamente essa fase. Se liga nessa fita com o Felp 22, um dos integrantes do grupo Cacife Clandestino, que também é cria do Rio de Janeiro.

“Esses dias tava no estúdio do Cacife, com o Felp 22 e ele me perguntou: cara, o que cê sente quando ouve um beat de rap? Respondi que sinto vontade de voar. Um sentimento de que agora posso escrever o que eu quero, dizer o que eu penso”, conta. “No funk é diferente, acho que tenho algo mais fechado, é algo diferente. Digo por mim, não sei se todos os funkeiros pensam assim, mas eu adoro fazer parceria com os rappers”.

Há uns dias, mostramos o trampo do produtor WC no Beat, que fez um álbum inteiro de collabs entre funkeiros e rappers, onde o MC Cabelinho também faz algumas participações. Também existem outros artistas que fazem esse intercâmbio, como o rapper mineiro Djonga, que fez alguns trabalhos com funkeiros de Belo Horizonte, sua cidade natal, e também a galera do Pollo, que já fez trampos com o MC Pedrinho. Esse são só alguns exemplos das parcerias entre os ritmos nos dias atuais.

Cria da Zona Sul do Rio de Janeiro, mais especificamente das comunidades do Pavão-Pavãozinho e Canta Galo, Victor Hugo Oliveira do Nascimento começou sua trajetória lá em meados de 2011, fazendo funk para os bondes desses lugares. O nome artístico de Cabelinho veio só no ano seguinte, com a ajuda de um amigo DJ. Junto com o novo nome, veio a certeza do que queria fazer para viver.

“Geral me conhecia de Vitinho, e daí virei o MC Vitinho. Em 2012, decidi que queria viver de música e caí pra dentro. Conversando com um amigo DJ, ele me disse que tinha que trocar de nome, porque já tinha um MC Vitinho na pista. Eu tinha cabelo arrepiado, usava bastante gel e daí acabou ficando Cabelinho”.

Pronto, nome artístico feito, agora era hora de fazer sucesso. É, digamos que o processo demorou um pouco. O cantor ralou bastante até conseguir seus primeiros shows, conseguindo assim viver da música e provar pra família que aquela coisa “de maluco” era uma parada pra valer.

“Entre 2012 e 2016, eu fazia música e lançava na internet, mas nenhuma batia”, lembra de forma saudosa. “Eu fui conquistando minhas coisas aos poucos, o público foi me conhecendo dessa forma. Minha família já achava que era coisa de maluco. Eu só estudava e fazia uns bicos pra pagar meus drinks, minhas baladas, essas paradas”.

2016 foi o ano da virada para o MC Cabelinho. Seu primeiro grande estouro foi “Morrão tá Lindo“, que retrata bem o cotidiano da quebrada. Aliás, foi com essa temática mais consciente que o funkeiro ficou conhecido. Logo em seguida, ele lançou outras duas que também marcaram sua carreira, “Toda Hora” e “Voz do Coração“. Daí veio “Zona Sul“, com direito a videoclipe no Canal KondZilla e mais de 10 milhões de visualizações.

Cantor e compositor, Cabelinho faz questão de sempre citar a quebrada nas suas canções, mesmo quando as músicas têm uma pegada mais romântica, sua nova vibe pro momento. “Enquanto eu tiver podendo, eu quero trazer a favela pra cada música ou clipe meu. Eu prefiro gravar mais coisas com letras, não curto muito putaria e música só de refrão. “Zona Sul” e “Vamos Fugir” são bons exemplos dessa parada que tô apostando agora, mais romantico mesmo”.

Quando o assunto é funk carioca ou funk de São Paulo, o cantor diz não acreditar em diferenciação entre os Estados. Como já falamos na nossa visita ao Rio de Janeiro durante o Rio Parada Funk do ano passado, os hits do funk paulista invadiram inclusive o Rio de Janeiro, que abraça a cultura sem esquecer a história.

“Tem suas diferenças, algo mais na questão de produção mesmo”, adianta. “Mas o funk em si é um só. O funk de São Paulo, o Rio de Janeiro todo escuta. Não acho uma vitória pro funk do Rio ou pro funk de SP, acredito que seja uma vitória pro funk. Ponto. Fico felizão de ouvir o funk de SP tocando no Rio, ou o funk do Rio tocando em Minas, o funk de Minas tocando no Espírito Santo, e assim por diante”.

Como em qualquer outra profissão, o cantor tem suas inspirações. E a do MC Cabelinho é nada mais, nada menos que a cantora Amy Whinehouse, que ficou famosa em todo mundo pela sua voz mais que poderosa. “Tenho ela tatuada, já fui pra Londres por causa dela. O que acho mais foda é que ela era verdadeira demais e tem uma história de vida que me inspira muito”.

Referência para muito jovem carioca que sonha em ser MC, Victor Hugo ainda se diz assustado com a repercussão do seu trabalho e de como ele afeta outras pessoas. Mesmo assim, ele tem a noção exata da importância de ser um exemplo a ser seguido.

“O artista carrega uma responsa muito grande, acredito que se eu fumar um cigarro e tal, vou tá influenciando o menor a pegar um cigarro também. Mas por um outro lado, tenho uma boa influência porque se eu virar pro lado e falar que o Cabelinho não completou os estudos, mas vocês têm que estudar, sei que muita gente vai abraçar meu papo. Então acho bom pra caralho ser uma referência”.

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